quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Os dados da violência racial no país

Os dados estatísticos de mortalidade por homicídios vêm ocupando destaque nas discussões sobre violência no Brasil. O tema é foco de análises e debates em instituições acadêmicas, organizações da sociedade civil e pela sociedade em geral, que procura refletir sobre o fenômeno que ceifa vidas de brasileiros, cada vez mais cedo. Homens jovens, particularmente da raça negra e dos centros urbanos, são as principais vítimas de homicídios.


Antes de dar continuidade a abordagem dos fatos se faz necessária a explicação sobre o conceito de raça. Neste trabalho, o conceito de raça será utilizado como uma categoria socialmente construída, que é empregada para informar como determinadas características físicas (cor da pele, textura de cabelos, formato de lábios e nariz) e também manifestações culturais, influenciam, interferem e até mesmo determinam o destino e o lugar dos sujeitos no interior da sociedade brasileira. A noção de raça, que ainda permeia o imaginário social brasileiro, tem sido utilizada para excluir ou alocar indivíduos em determinadas posições na estrutura social e também para deixá-los viver ou morrer.


Os dados registrados pela série documental Mapa da Violência: os jovens do Brasil , revelam que nossas taxas de homicídios são elevadas e tem como principal vítima a população do sexo masculino pertencente a raça negra. Negros é o grupo racial brasileiro mais vulnerável à morte por homicídios. O estudo aponta que no ano de 2004, a taxa de vitimização desse grupo foi de 31,7 em 100 mil negros, enquanto para a população branca foi de 18,3 homicídios em 100 mil brancos. A população negra teve 73,1% de vítimas de homicídio a mais do que a população branca (WAISELFISZ, 2006, p.58).


A denúncia da participação desproporcional de negros como vítimas de homicídios não é assunto recente. O Movimento Negro Unificado-MNU foi fundado no ano de 1978, em ato público realizado em São Paulo, onde denunciou, entre as muitas violências sofridas pela população negra, a tortura e morte de um homem negro nas dependências de uma delegacia de policia, crimes que foram praticados por policiais. No ano de 1995, o Movimento Negro entregou ao presidente Fernando Henrique Cardoso, o documento Marcha Zumbi dos Palmares, contra o racismo, pela cidadania e pela vida, que afirmava no capítulo referente à violência que "[...] de 1970 à 1992 a Polícia Militar de São Paulo matou cerca de 8.000 pessoas; das 4.170 vítimas identificadas, 51% eram negras, numa cidade em que, segundo o IBGE, os negros somam 25% da população" (MARCHA, 1995).

O documento informava ainda: "Deste modo, uma estratégia de repressão alterna agressões policiais, prisões arbitrárias, tortura e extermínio. Nesta estratégia, o principal alvo é o homem negro" (Ibid., p.11).

No ano de 1998, Barbosa (1998, p.100-101), em estudo sobre o perfil da mortalidade no Estado de São Paulo, afirmava que os índices estatísticos disponíveis à época sobre mortes violentas revelavam que homens negros tinham maior risco que os brancos de morrer por homicídios. Para a autora
[...] o perfil de mortalidade do homem negro oferece possibilidades de compreensão das condições de vida da família negra, em sua maioria, pautada pela carência em moradia, instrução, emprego e renda, onde se encontram em maior proporção as chefias de mulheres.

População marcada pela exclusão e marginalização, negros e negras brasileiros têm vivido há séculos como seres humanos destituídos de direitos e como portadores de uma humanidade incompleta, o que tornou natural a não participação igualitária dessa população do pleno gozo de direitos humanos. Esta naturalização implicou na aceitação das conhecidas desigualdades sociais que marcam a sociedade brasileira, sendo que a divulgação de dados sobre essa realidade não são acompanhados de medidas eficazes no combate às desigualdades raciais. O racismo estrutura e determina as relações raciais brasileiras e incide nas condições precárias de vida da população negra.


Texto: Rodnei Jericó e Suelaine Carneiro - Fonte: Geledes (http://www.geledes.org.br/ )

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